sábado, 27 de março de 2010

Sua eterna bonequinha

Queria eu ter tido força de te dar adeus, mas sabe, essa minha armadura impenetrável quebrou quando você partiu. Aquela armadura de aço inquebrável, esfarelou. Pois bem. Não tive força. Vontade. Não tive, me perdoa. Mas me faltou coragem. Ver-te naquele leito tão quietinha. Os antigos olhinhos sorridentes cerrados no seu sono eterno. Seria doloroso demais, entende?
Imagino que se eu a olhasse ali não me aguentaria. E transformaria aquela sala medonha em um oceano de lágrimas, como fiz com o corredor. Eu sentaria do seu lado, seguraria sua cálida mão já sem movimento, olharia em seu rostinho já pálido e relembraria você segurando minha mão e contando orgulhosamente suas batalhas, suas voltas por cima. O jeito que seus olhos brilhavam em cada vitória que narrava. Os sorrisos já fracos falando de meu pai, meu tio e minhas tias aprontando pelo quintal da casa. As preocupações que não as preocupou. Você ria delas. Você sabia que Deus ia te ajudar, te tirar de qualquer sufoco. E ele lhe tirou, não é? Todas aquelas preces em dias de ação de graças, refeições em família, aniversários. Todos domingos, ainda que suas pernas não aguentassem mais aquela ladeira, você ia agradecer por tudo, pedir a benção para todos nós e perdão por não cometer nenhum pecado para que pudesse pedir perdão.
Por fim, vó, eu lembraria de você segurando minha mão como sempre fazia. Dois beijos no rosto, um pedido de benção e você olhava em meus olhos e docemente produzia uma leve frase já decorada e ouvida com muito gosto a 18 anos. 'Minha bonequinha", você dizia. E eu me ia pra casa.
Então, dizendo o adeus que não pude dar por antecipação do destino, te digo adeus. Sem muito mais, pois creio que isso é tudo que consigo falar. A Deus, peço que cuide dessa preciosidade que infelizmente, teve de partir. E se Deus puder lhe entregar essa ultima mensagem, quero que saiba minha vó que serei sua eterna bonequinha. E que essa bonequinha morrerá de saudades. Viveremos todos com saudades. Por fim, Adeus vó Dita.

domingo, 21 de março de 2010

As vezes,

As vezes é tão fácil esquecer. As vezes é tão fácil relembrar.
As vezes fingimos que amor é brinquedo que a gente brinca, gasta.
Aí ele envelhece e a gente deixa de lado, ou quebra e descartamos pra ir atrás de outro, outros.
As vezes, nem esperamos envelhecer. Apenas enjoamos e jogamos fora feito goma de mascar sem sabor.
Também tem vezes que acreditamos fielmente que o amor acabou, e na tolice de nossa mente, a gente se afoga e morre sem saber que amor que é amor, não acaba.
Tem vezes que a ficção de uma imagem iludi nossa mente com a imagem de um falso amor.
E você acredita, vai atrás.
Corre feito desesperado e acaba amargado na desilusão de sofrer por perder um falso amor sem razão.
E tambem acontece de não se perceber quem é o amor de verdade. Acontece. Tolice humana sem razão.
Acontece de você não ter medo de perder alguém, mas ter medo de ter ou reter esse alguém.
Acontece tanta coisa. Tanto amor sem amor. Tanta paixão, tanto sentimento em vão.
Como se já não bastasse a dureza infinita da vida, ainda temos de amar.
E como mero mortal, eu entendo.
As vezes amamos sem amor. Nos apaixonamos por imagem.
Nos encantamos por palavras.
Pois é. Eu dei minha vida por uma miragem.

sábado, 20 de março de 2010

Amor,

Passa-me as vezes na ideia, a dúvida de saber por onde andas. Questiono-me a cada segundo se há de voltar aqui para sua casa, seu lar. Algumas vezes até me indago sobre sua existência e se realmente residiu em nossa relação, e enquanto me distribuo em pulsos duvidosos, mergulho em lembranças que me pergunto terem sido um palpite irreal ou se foi um sentimento que esteve realmente em mim presente.
Sabe amor, me ocorre lembranças de quanto te encontrei em meu primeiro romance. Recordo de como você fez com que as cores foscas, mortas de uma tarde de outono, virassem cores reluzentes de uma manhã de primavera. Fez com que eu ricocheteasse feito epiléptico em crise. Fez com que todo sangue que girava em mim, acelerasse e aquecesse como nunca antes feito. Amor, tu me invadiras sem nem pedir licença e logo no primeiro contato. Incrível como nossa história é longa. Esteve sempre comigo. Desde o primeiro contato com sentimento até o ultimo que vim a sentir.
Porém, como um sopro de vento, você se foi. Não deu adeus. Apenas sumiu. Só me recordo de amanhecer o dia sem sentir você aqui. Procurei em cada veia, por vestígios seus. Em vão. Não te encontrei. Então esvaí-me em dor, e nessa dor, fui me entregando a outra que me deu um sentimento de vazio. Com ela, eu sentia apenas um nada dentro de mim. Sentia-me como um oco objeto frio e cálido sem rumo, e quando existia algo dentro de mim, esse algo me lembrava você. Como se só existisse você. Incompleta, me entreguei a mais um corpo. A outro que me torturou, me amordaçou e me esgotou quase que completamente. Não tive prazer e não tenho prazer nenhum com nenhum dos dois. Em todo esse tempo revezando os dois, nada senti a não ser dor. Estou aprisionada sem ter como escapar.
Por isso, eis-me que te imploro, te suplico que volte. Se soubesse como sua falta me desvaloriza, me inutiliza, talvez voltasse por mera pena de mim.
Aguardo ansiosamente sua volta enquanto a saudade e o sofrimento me revezam em suas posses. Esta carta é meu último suspiro de vida, meu último pulsar de resistência. Lhe aguardo entre meus átrios e ventrículos.

Sinto sua falta.

Coração.

segunda-feira, 15 de março de 2010

Uma noite inteira

Então, tudo bem. Vou ficar.
Se me pediu assim tão singela
Eu prometo que fico até você acordar.
Se me pediu assim, tanto carinho
É porque precisa não sentir
seu corpo tão sozinho.
E o que me custa te observar?
Enquanto dorme e suspira
O que me custa te ver sonhar?
Diga-me amor, o que posso perder,
Perdendo uma noite observando você?
Então deite teu corpo ao meu lado
Deixe aqui no meu abraço
O que te preocupa, o seu fardo.
E durma bem, descance, apague.
E eu prometo que uma noite inteira
Eu a observarei com todo amor
que amo além do que me cabe.

domingo, 14 de março de 2010

Adeus

Leãozinho. Gosto tanto de você, leãozinho, que quase não tenho descanso. Quase não a vejo mais sorrindo, e já venho me esquecendo de seu encanto. Então direi num suspiro de palavras, em uma longa puxada de vocábulos um 'adeus'. E como abreviar nesta carta o sentido que as palavras devem tomar, eu não sei. Tentarei. Lutarei e deixarei explícito o que ocorre tentando não te arrancar uma lágrima se quer. Pois bem minha cara, barata menina, eis-me aqui caçando palavras rebuscadas pra dizer o inevitável. Sabíamos desde o começo. Não daria certo, não seria nada. Águas passadas que destruíram esse meu miserável ser sofredor. Feliz amor, infeliz que vivemos sem culpa. Esmurrou em mim a paixão e você fez o que quis. Agora pede desculpa, maluca! Amamos sem culpa, enquanto você era um mar de medo, correndo de ser feliz. 'Quero manter a imagem', você diz. Então fugiu do seu amor, de tudo que sempre quis.
Se assim fez, minha flor, assim continuará desbotando cada pétala desse amor. E eu fugindo da vida, estou seguindo. Vou-me embora cruzar a luz ou pra onde não haja dor. Eu to enrolando, eu sei. Estou ga-gaguejando milhões de besteiras, asneiras e não chego a nenhum lugar. Entenda, meu bebê, é difícil se despedir da sua fonte de ar, sua razão de amar.
Quero dizer-te que te amei. Que te amo. E levarei para longe comigo. Ainda que no céu dos hipócritas, ou no inferno dos pobres danados condenados a amar. Ainda que no limbo presa a um esboço de alma, eu te amarei. Mas partirei. Deixarei-te em paz. Arranjarei uma passagem adiantada para o submundo por via de alguma bobagem. Um mergulho no oceano, um remédio tomado por engano. Mas partirei. Arderá na minha carne, saudades de você. E minha alma será eternamente chorosa por te perder. Por ter sido tão covarde e por não ter sido de verdade tudo de mim o melhor de você. Perdão minha singela, mas esta aqui sua faixa amarela. Arquive-a em qualquer gaveta esquecida ou guarde-a pra chorar quando ficar saudosa de meus beijos. Adeus.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Câncer

A chuva torrencial despencava pela cidade. As ruas, tornaram-se corregos. Os corregos tomaram a rua. Litros de água se chocavam no toldo do bar e escorriam, descendo pela frente de seu olho. 'Subam! Sentem na mesa', gritava o pobre dono do bar que afagava a cabeça já pensando nas despezas que as águas invasoras trariam. Fugindo da agitação, sentou-se ela na mureta do bar tomando nas costa a chuva gelada, sem nem se importar. Era só água. Alguem toma seu lado como refúgio e aborda uma tentativa de diálogo.
- Que chuva, Meu Deus!
- Deus, não. São Pedro é Santo.
- Ateu?
- Não. Católica.
- Acredita que isso é coisa de São Pedro?
- Acredito que é chuva. Cigarro?
- Não, obrigado. Não fumo. E você é jovem, não deveria também.
- Vou envelhecer um dia.
- Não tem medo de estragar seus pulmões?
- Pelo menos tenho dois pra estragar. Se mal lhe pergunto, tens medo da morte?
- Sim, muito. Você não?
- Não. Vai acontecer. Um tiro na testa, uma doença mal tratada, uma infecção, um câncer. Vou morrer e ponto.
- Mas não tem medo de morrer cedo?
- Não mais.
- Mas já teve?
- Antes de amar... Agora a morte me parece uma ideia confortável.

Toda mentira tem seu fim.

E ela a mim:
- Sinto sua falta. Falta do teu aconchego, do teu braço envolto de mim. Do beijo no queijo, do amor nas sombras e o fúnebre sorriso que sumiu quando partiu. Mas não seremos verdade para o mundo. Seremos verdade uma a outra e só. Porque nos amamos, certo? É tudo que importa!
- Não concordo. Se não somos verdade para o mundo, não somos para nós.Pois o nosso amor é nosso mundo. E se não existe, para o mundo, nosso amor não existe.
- Existe, meu amor! E esta aqui! Não vê?
- Não. Não o vejo. E quer saber? Eu não quero mais saber de falsas verdades. Desses pequenos rastros miseráveis e hipócritas de uma existência falha sua. Não quero ser uma mentira. Ou não existir. Sinceramente, não suporto mais. Lamento admitir que jaz aqui nessas ultimas palavras o amor que empenhei em pró de uma criança mimada que só queria atenção. Pois bem, menininha medíocre, você conseguiu atenção e mais. Conseguiu com essa brincadeira carinhosa destruir meus planos e caminhos planejados. E digo mais! Não amei-te, realmente. Amei a imagem de um romance que criei em minha imaginação baseado na antiga ficção platônica pelo que sua imagem representava. Então parta e vá-se pra nunca mais voltar, pois não te quero interferindo em meus passos novamente. Vá e arranje mais meio milhão de bobos, pois esse já se desiludiu de seus caprichos e mentiras.
Como um último gesto, tinha em minhas mãos um pedaço de lata retorcido em dourado. Lancei-o ao chão, dando as costas:
- Aproveita leve essa lata e o maço.

terça-feira, 9 de março de 2010

Foi tudo que sobrou...


" Ah! Se inspira-me tua beleza!
Teus traços morenos, tuas curvas do corpo
e como inspira-me tua grandeza.
Seu rebolado de criança e ao mesmo tempo de mulher(...)"
Isso foi tudo que me sobrou.
Um trecho que rabisquei no auge da tolice daquele amor abobalhado
sobreposto em uma foto dedicada a mim.
É isso que sobrou de todo um poema a ela dedicado
na época em que acreditei em 'amor sem fim'.
É tudo que sobrou. É o resto tatuado na minha cara.
E só. Somente em meu rosto.
No outro já não se vê nem cicatriz
por trás da máscara de mentiras que ela diz.
Era tão somente amor, que hoje não ama, não sente, nem nunca ficou.
Era tão forte e 'inenarravel'
Que se fez abalável, irreal e por fim
dispensável.
Amor de bobeira, creio eu, de outubro a janeiro.
Amor de mentirinha, continho de fadas terminado em fevereiro.
Foi tudo que sobrou...
Uma foto com o poema no rosto daquela que amei.
E me enganou.
Aquela que me disse 'eu te amo'
mas não me amou.